domingo, 15 de dezembro de 2013

QUEM NÃO GOSTA DE POLÍTICA É CONTROLADO PELOS QUE GOSTAM



Murillo de Aragão

(...) Entre muitos males que nos afligem nos dias de hoje, vejo dois com especial preocupação: a civilização do espetáculo e o “dirigismo” político e econômico. Ambos são vetores que atuam para escravizar o indivíduo no universo da superficialidade e do diversionismo.

Resultam, simplesmente, do entendimento de que os que não gostam de política serão controlados pelos que gostam. Os que gostam não são distraídos pelo espetáculo: promovem-no.

Como os dois males de nosso tempo nos afligem? A civilização do espetáculo é, em síntese, a combinação da banalização das artes e da cultura com o trunfo do jornalismo superficial e sensacionalista.

Tudo resulta em transformar a vida em um grande espetáculo onde os atores são mais importantes do que o enredo. Onde a cenografia é mais relevante do que a realidade. Onde as ideias pouco importam e as liberdades e direitos são traduzidos em capacidade de consumo.

O espetáculo, para ser eficiente politicamente, exige que se controle a informação. Seja de forma brutal e direta, como nos regimes de exceção, seja de forma sutil, por meios indiretos ou através da saturação de informações irrelevantes e do entretenimento.

O espetáculo também pode não gerar satisfação nem frivolidade. Mas terror e medo, em países ditatoriais que cultuam a possibilidade de punição para manter a lealdade e o “desengajamento” do debate. No final das contas, a sociedade fica bipolar: os poucos que mandam e os muitos que obedecem.

O outro mal é o dirigismo econômico e político. Tanto este mal quanto o outro ocorrem às vezes com boas intenções. No entanto, sempre terminam mal. Algumas vezes são libertadores que chegam e terminam escravizando os seus. Usam dos recursos do poder para enriquecer. Situações vividas em muitos países da América do Sul, África e Ásia, onde os donos do poder são os donos das riquezas do país.

Os dois temas de que trato neste texto são abordados em dois livros essenciais para quem deseja entender os dias de hoje. “A civilização do espetáculo”, de Mario Vargas Llosa (Objetiva) e “Por que as nações fracassam”, de Daron Acemoglu e James Robinson (Elsevier-Campus). O livro de Vargas Llosa tem quase duzentas páginas e é dividido em artigos e ensaios. Leitura mais do que agradável, revela a potência e a lucidez de seu pensamento e de sua leitura sobre os tempos atuais.

Já a obra de Acemoglu e Robinson, ainda que agradável e nada acadêmica em sua linguagem, é mais consistente pelo volume de informações e, como disse Steven Levitt (coautor de Freakonomics), pela mistura de história, ciência política e economia.

Os autores são muito claros ao mostrar que o voluntarismo intervencionista termina destruindo sociedades ou impedindo que estas realizem o seu potencial. Não é, apesar do tom, um livro neoliberal ou daqueles que propõem um Estado mínimo e toda a força ao mercado.

Mas, sobretudo, esse livro reconhece que o poder do indivíduo, da inovação, da educação e do livre fluxo de informação pode fazer a diferença. São abundantes os exemplos de declínio de cidades como Veneza e de impérios como o otomano, a partir do obscurantismo intervencionismo. A América do Sul é muito bem retratada. O Brasil, infelizmente,é pouco mencionado. A Argentina, talvez pela vocação para o desastre, merece mais atenção dos autores.

A leitura de ambos os livros proporciona sérias reflexões sobre os males de hoje no Brasil. 

Mas o que realmente preocupa é o amanhã. Não estamos preparando os cuidados de que iremos necessitar. A começar pela urgente reforma de nossas instituições políticas. Ambos os citados males de nosso tempo estão vinculados diretamente com a qualidade de nossas instituições, a qualidade do fluxo de informações, o discernimento e a educação de nossa cidadania e a qualidade de nossa participação no debate político.

Leia em Ao dia o seu próprio mal

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