domingo, 21 de abril de 2013

O QUE MATA NÃO É A RELIGIÃO, É A MALDADE OU O FANATISMO

Se terroristas estiverem ligados a uma rede, é ruim; se não estiverem, pode ser ainda pior. Ou: Façamos de conta que eles eram budistas!
Reinaldo Azevedo
Os dois terroristas que praticaram os atentados de Boston eram chechenos. Um está morto, Tamerlan Tsarnev, e o outro, Dzhokhar Tsarnaev, foi preso. Só não vão matar e machucar mais ninguém porque, enquanto os supostos poetas da paz se encarregavam de criticar os “paranoicos e reacionários”, os paranoicos e reacionários cuidavam dos sistemas de segurança que permitiram identificar, prender ou matar facínoras como esses. 
Por que escrevo assim? Porque os “progressistas”, nos EUA, no Brasil e em toda parte, já anteveem o que chamam “histeria” da direita, o crescimento da xenofobia etc. Sim, leitor, pode parecer incrível, mas o alvo desses bacanas são pessoas que não mataram ninguém, que não feririam ninguém, que não molestaram ninguém. Há também quem já anuncie — e isso não deixa de estar subjacente à fala de Barack Obama — que não faz sentido relacionar os ataques ao fato de os dois serem muçulmanos.
Então ok. Podemos fazer de conta que eram budistas, católicos, protestantes tradicionais, judeus, evangélicos, xintoístas. Afinal, como é sabido, volta e meia, os crentes dessas religiões saem por aí explodindo bombas, praticando atentados terroristas, matando inocentes em nome de sua causa, não é mesmo?
É impressionante! Tenta-se, desde já, cobrir a realidade com um véu, suficientemente diáfano para que todos saibamos o que aconteceu, mas espesso o bastante para tentar nos convencer a olhar para o outro lado. “Ah, mas eram chechenos!” E daí? O terrorismo islâmico não é apanágio dos árabes, como sabem o Afeganistão, o Paquistão, a Indonésia, a Caxemira… Aonde que quer a religião tenha chegado, chegou junto a ideia do martírio e da “jihad”, vista não mais como o esforço para não fugir do caminho da fé, mas como a restauração da verdadeira religião — e isso supunha a violência.
Mas por que dois chechenos, defensores da independência de sua região de origem, atacam americanos em vez de atacar os russos? Sabe-se lá… A cabeça de terroristas opera com uma lógica muito particular. O que é estúpido é fazer de conta que a Chechênia não é um dos celeiros mundiais do terrorismo islâmico, ainda que a sua mão de obra seja recrutada especialmente para a luta local. O que é ridículo é descartar de saída que mesmo chechenos possam se integrar a uma rede maior do terror.
Um dos irmãos deixou um depoimento dizendo que não tinha amigos americanos e que não os compreendia. Tinha 26 anos e estudava engenharia. O mais jovem, que foi preso, tem 19 e cursava o segundo ano de medicina. Tinha até recebido um prêmio em dinheiro como incentivo a jovens talentos. Os EUA haviam dado a ambos, enfim, a oportunidade de estudar, de crescer, de se desenvolver.
E por que, então, os ataques terroristas? 
Ao ler a respeito dos dois, lembrei-me de Sayyid Qutb (1906-1966), o homem que sucedeu Hasan al-Bana, o fundador, no comando da Irmandade Muçulmana. Qutb era um fanático da violência. Formado em educação, foi enviado pelo governo egípcio para conhecer os EUA: Nova York, Washington, Colorado e Califórnia. Ele odiou tudo o que viu e só enxergou decadência — até o hábito de aparar a grama lhe parecia prova cabal de futilidade. Se Al-Banna aceitava a violência para o propósito de unir os muçulmanos num só califado, seu sucessor foi mais longe: era preciso converter também, e pelos mesmos métodos, o mundo não islâmico. E fazê-lo deveria ser tarefa de todo muçulmano.
Para quem não entendeu, tento ser ainda mais claro: é relevante, sim, saber se os irmãos estavam ligados a uma rede de terror ou se atuaram por conta própria. Mas é mais relevante ainda considerar que essa segunda hipótese pode ser ainda mais aterradora porque apontaria para uma espécie de banalização do terror religioso. 
Pior do que haver uma Al Qaeda ou congênere planejando grandes atentados seria a explosão de bombas ser considerada uma forma de reza, ainda que a iniciativa não estivesse conectada a um comando.
É claro que essas ocorrências terão reflexo no debate sobre a nova lei de imigração que está no Senado, que conta com o apoio dos democratas e de boa parte dos republicanos. E não há nada de errado que assim seja. Faz parte da política. Faz parte da democracia. Estranho seria se os congressistas e os americanos fizessem de conta que as bombas não explodiram, que elas não foram detonadas por dois chechenos e que eles, afinal de contas, não eram muçulmanos. É preciso tomar cuidado com as manifestações de xenofobia? Claro que sim! Mas também é preciso tomar cuidado a imigração.
“Qualquer americano pode fazer muito mais estrago dando tiros numa escola primária.” É fato! Atiradores ou assassinos em série, no entanto, não têm uma “causa” que se pretende coletiva nem estão determinados a converter o mundo.

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