segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Verdade não é boato - descontrolada, a emenda da candidata ficou pior do que o soneto

Por Reinaldo Azevedo

Debate - Tchutchuca do neoestatismo desenvolvimentista parte pra briga…
Ou: da verdade sobre o aborto e da mentira sobre as privatizações


Talvez a coisa ande mais feia no arraial petista do que indica a primeira pesquisa.
O fato é que a Dilma Rousseff que se viu ontem no debate da Band é muito diferente daquela que aparece no horário eleitoral gratuito.
Aquela senhora que se esforça para ser suave, a mãe do Brasil, a tchutchuca do neoestatismo desenvolvimentista, a que aprendeu a endurecer sem perder a ternura jamais, nem parecia ter Antonio Palocci como um dos coordenadores da campanha.
O que se viu ali era o estilo Ciro Gomes, dá umas tiriricadas no meio da frase, o sentido às vezes se esvai.
Não deu folga: partiu pra cima do tucano José Serra.
O debate foi útil para saber as duas armas do PT no segundo turno: vitimismo agressivo e, de novo!, ataque às privatizações.

Eu tinha a expectativa de que seria Dilma a primeira a tocar no assunto do aborto.
Batata!
Com que objetivo?
Parece que a intenção era uma só: “Se eu sair daqui conseguindo, no mínimo, dividir com ele o peso da questão do aborto, já está bom”.
Não acho que tenha conseguido.
A razão é simples, elementar mesmo: ela já defendeu a descriminação em várias entrevistas; ele não.

Dada a ausência de limites que sempre caracteriza os petistas, Dilma tentou uma saída complicada: acusar Serra de ser o autor da norma técnica que disciplina o aborto legal nos hospitais públicos nos dois casos permitidos: estupro e risco de morte da mãe.
Como não podia dizer que isso é, em si, um mal, dado que a lei data de 1940, dois anos antes de Serra nascer, ao mesmo tempo em que tentava acusá-lo, ela se dizia favorável à medida.
Dilma se esqueceu de que a norma técnica em questão exigia o boletim de ocorrência em caso de estupro; quem acabou com o BO, bastando a declaração, foi o petista Humberto Costa quando ministro da Saúde.

Eu reluto sempre em dizer quem ganhou, quem perdeu, porque é a percepção do publico que conta nesse caso.
A minha impressão é a de que a imagem de tranqüilidade de Serra contrastou com a de fera ferida de Dilma, que se mostrou acuada, brava, aerofágica, carrancuda, desfazendo, ao menos naquele encontro, a imagem da condutora tranqüila do PAC.

A segunda peça de resistência é a mesma de 2006: Dilma repete o texto de Lula e acusa os tucanos de “privatistas”, afirmando que eles têm a intenção de privatizar o pré-sal, a Petrobras e por aí afora.

Parte da imprensa acha um “absurdo” e uma “baixaria” que se atribua a Dilma o que Dilma realmente fez: a defesa da descriminação do aborto.
Mas certamente vai considerar que o tema “privatização” é nada além de uma questão política, embora se trate de uma mentira grotesca no que se refere ao presente e ao passado.

Os programas do PT certamente continuarão a vender aquele Brasil “como nunca antes na história destepaiz”, mas vão optar, como dois e dois são quatro, pela demonização das privatizações feitas no governo FHC — o que é intelectual e moralmente criminoso no mérito e nas circunstância.
O tom apenas propositivo, próprio do tempo em que eles imaginavam não ter adversários, cederá àquilo que o PT sabe fazer muito bem e que sempre caracterizou a sua abordagem da política: a tentativa de desmoralizar o adversário.
E vai ser na base da pauleira, mais para Ciro Gomes do que para Antônio Palocci.

É um debate que terá de ser enfrentado pelo candidato da oposição, entendo, de dois modos: evidenciando os ganhos óbvios da privatização e demonstrando que a privatização do PT se faz de outro modo: a dos tucanos se dá na Bolsa de Valores;, com regras; a de seus adversários, na bolsa dos larápios que atuavam, por exemplo, na Casa Civil.

Os candidatos debateram ainda segurança pública e o programa Minha Casa, Minha Vida.
Dilma tentou esculhambar São Paulo, que apresenta hoje um dos menores índices de homicídio do país.
A taxa do Brasil é quase o triplo.
No caso do programa de casas populares, acusou, o que também é falso, o adversário de ser contra o programa.
Nunca houve uma frase de Serra atacando a iniciativa — e isso é fato.
O que ele fez, no caso, foi falar a verdade: Dilma prometeu 1 milhão de casa, e Lula encerrará o mandato entregando pouco mais de 150 mil.

Foi o embate mais duro da campanha.
Tenho a impressão de que Dilma perdeu porque uma coisa é ser firme; outra, diferente, é ser agressiva.
Ela me parecia muitos tons acima do necessário.
Ali, parecia estar entregue à sua própria natureza, como quem se revelasse.
E o tucano não perdeu a chance de apontar os excessos, dizendo-se, um tanto irônico, surpreso com o comportamento da adversária.
Não estava, é claro.
No fundo, todos estávamos constatando o que já sabíamos.

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