sábado, 16 de julho de 2011

Por que o brasileiro não se indigna e não vai à praça protestar contra a corrupção?

Por Reinaldo Azevedo

Juan Arias, correspondente do jornal espanhol El País no Brasil, escreveu no dia 7 um artigo indagando onde estão os indignados do Brasil.
Por que não ocupam as praças para protestar contra a corrupção e os desmandos?
Não saberiam os brasileiros reagir à hipocrisia e à falta de ética dos políticos?
Será mesmo este um país cujo povo tem uma índole de tal sorte pacífica que se contentaria com tão pouco?
A resposta não é simples nem linear.
Há vários fatores distintos que se conjugam.


Povo privatizado
O “povo” não está nas ruas, meu caro Juan, porque foi privatizado pelo PT.
No Brasil, as esquerdas, os petistas em particular, desde a redemocratização, têm uma espécie de monopólio da praça.
Disse Lula: “A praça é do povo como o povo é do PT”.

O “povo” não está nas ruas, meu caro Juan Arias, porque o PT compra, por exemplo, o MST com o dinheiro que repassa a suas entidades não exatamente para fazer reforma agrária, mas para manter ativo o próprio aparelho político — às vezes crítico ao governo, mas sempre unido numa disputa eleitoral.

Os míticos estudantes não estão nas ruas porque empenhados em seus protestos a favor.
Você tem ciência, meu caro Juan, de algum outro país do mundo em que se fazem protestos a favor do governo?
Certamente na Cuba comuno-fascistóide dos irmãos Castro e na tirania síria.
E no Brasil.
Por quê?

Porque a UNE é hoje uma repartição pública alimentada com milhões de reais pelo lulo-petismo.
Foi comprada pelo governo por quase R$ 50 milhões.


Nesse período, esses patriotas, meu caro Juan, se mobilizaram, por exemplo, contra o “Provão”, depois chamado de Enade, o exame que avalia a qualidade das universidades, mas não moveram um palha contra o esbulho que significa, NA FORMA COMO EXISTE, o ProUni, um programa que já transferiu bilhões às mantenedoras privadas de ensino, sem que exista a exigência da qualidade.

Não se esqueça de que a UNE, durante o mensalão, foi uma das entidades que protestaram contra o que a canalha chamou “golpe da mídia”.
Vale dizer: a entidade saiu em defesa de Delúbio Soares, de José Dirceu, de Marcos Valério e companhia.


Um de seus ex-presidentes e então um dos líderes das manifestações que resultaram na queda de Fernando Collor é hoje senador pelo PT do Rio e defensor estridente dos malfeitos do PT.
Apontá-los, segundo o agora conservador Lindbergh Farias, é coisa de conspiração da “elites”.
Os antigos caras-pintadas têm hoje é a cara suja; os antigos caras-pintadas se converteram em verdadeiros caras-de-pau.

Centrais sindicais
O que alguns chamam “povo”, Juan, chegaram, sim, a protestar em passado nem tão distante, no governo FHC.
Lá estava, por exemplo, a sempre vigilante CUT.

Foi à rua contra o Plano Real.
E o Plano Real era uma coisa boa.


Foi à rua contra a Lei de Responsabilidade Fiscal.
E a Lei de Responsabilidade Fiscal era uma coisa boa.


Foi à rua contra as privatizações.
E as privatizações eram uma coisa boa.


Saiba, Juan, que o PT votou contra até o Fundef, que era um fundo que destinava mais recursos ao ensino fundamental.
E onde estão hoje a CUT e as demais centrais sindicais?


Penduradas no poder.
Boa parte dos quadros dos governos Lula e Dilma vem do sindicalismo — inclusive o ministro que é âncora dupla da atual gestão: Paulo Bernardo (Comunicações), casado com Gleisi Hoffmann (Casa Civil).

O indecoroso Imposto Sindical, cobrado compulsoriamente dos trabalhadores, sejam sindicalizados ou não, alimenta as entidades sindicais e as centrais, que não são obrigadas a prestar contas dos milhões que recebem por ano.
Lula vetou o expediente legal que as obrigava a submeter esses gastos ao Tribunal de Contas da União.

Há um pouco mais, Juan.
Nas centrais, especialmente na CUT, os sindicatos dos empregados das estatais têm um peso fundamental, e eles são hoje os donos e gestores dos bilionários fundos de pensão manipulados pelo governo para encabrestar o capital privado ou se associar a ele — sempre depende do grau de rebeldia ou de “bonomia”do empresariado.

O MST, A UNE E OS SINDICATOS NÃO ESTÃO NAS RUAS CONTRA A CORRUPÇÃO, MEU CARO JUAN, PORQUE SÃO SÓCIOS MUITO BEM-REMUNERADOS DESSA CORRUPÇÃO.

Isso explica tudo? Ou: “Os Valores”
Ainda não!

Ao longo dos quase nove anos de poder petista, Juan, a sociedade brasileira ficou mais fraca, e o estado ficou mais forte.
Em vez de se aperfeiçoarem os mecanismos de controle desse estado, foi esse estado que encabrestou entidades da sociedade civil, engajando-as em sua pauta.

Até a antes sempre vigilante Ordem dos Advogados do Brasil flerta freqüentemente com o mau direito — e o STF não menos — em nome do “progresso”.
O petismo fez das agências reguladoras meras repartições partidárias, destruindo-lhes o caráter.

Enfraqueceram-se enormemente os fundamentos de uma sociedade aberta, democrática, plural.
Em nome da diversidade, da igualdade e do pluralismo, busca-se liquidar o debate.

Veja que coisa, meu caro: você conhece alguma grande democracia do mundo que, à moda brasileira, só congregue partidos que falam uma linguagem de esquerda?
Pouco importa, Juan, se sabem direito o que dizem e são ou não sinceros em sua convicção.
O que é relevante é o fato de que, no fim das contas, todos convergem com uma mesma escolha: mais estado e menos indivíduo; mais controle e menos liberdade individual.

Como pode, meu caro Juan, o principal partido de oposição no Brasil pensar, no fim das contas, que o problema do PT é de gestão, não de valores?
Você consegue se lembrar, insisto, de alguma grande democracia do mundo em que a palavra “direita” virou sinônimo de palavrão?

Imprensa
Se você não conhece democracia como a nossa, Juan, sabe que, com as exceções que confirmam a regra, também não há imprensa como a nossa no mundo democrático no que concerne aos valores ideológicos.

Vivemos sob uma quase ditadura de opinião.
Não que ela deixe de noticiar os desmandos — dois ministros do governo Dilma caíram, é bom deixar claro, porque o jornalismo fez o seu trabalho.
Mas lembre-se: nesta parte do texto, trato de valores.


Tome como exemplo o Código Florestal.
Um dia você conte em seu jornal que o Brasil tem 851 milhões de hectares.
Apenas 27% são ocupados pela agricultura e pela pecuária; 0,2% estão com as cidades e com as obras de infra-estrutura.
A agricultura ocupa 59,8 milhões (7% do total); as terras indígenas, 107,6 milhões (12,6%).

Que país construiu a agropecuária mais competitiva do mundo e abrigou 200 milhões de pessoas em apenas 27,2% de seu território, incluindo aí todas as obras de infra-estrutura?
Tais números, no entanto — do IBGE, do Ibama, do Incra e da Funai — são omitidos dos leitores (e do mundo) em nome da causa!

A crítica na imprensa foi esmagada pelo engajamento; não se formam nem se alimentam valores de contestação ao statu quo — que hoje, ora veja!, é petista.
Por quê?
Porque a imprensa de viés realmente liberal é minoritária no Brasil.

Dá-se enorme visibilidade aos movimentos de esquerdistas, mas se ignoram as manifestações em favor do estado de direito e da legalidade.
Curiosamente, somos, sim, um dos países mais desiguais do mundo, que está se tornando especialista em formar líderes que lutam… contra a desigualdade.
Entendeu a ironia?

Quem vai à rua?
Ora, Juan, quem vai, então, à rua?
Os esquerdistas estão se fartando na lambança do governismo, e aqueles que não comungam de suas idéias e que lastimam a corrupção e os desmandos praticamente inexistem para a opinião pública.
Quando se manifestam, são tratados como párias.

As esquerdas dos chamados movimentos sociais estão, sim, engajadas, mas em defender o governo e seus malfeitos.
Afirmam abertamente que tudo não passa de uma conspiração contra os movimentos populares.
As esquerdas infiltradas na imprensa demonizam toda e qualquer reação de caráter legalista — ou que não comungue de seus valores ditos “progressistas” — como expressão não de um pensamento diferente, divergente, mas como manifestação de atraso.

Descrevi, meu caro Juan, o que vejo.
Isso tem de ser necessariamente assim?
Acho que não!
A quem cabe, então, organizar a reação contra a passividade e a naturalização do escândalo, na qual se empenha hoje o PT?

Do seu colega brasileiro Reinaldo Azevedo.

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