terça-feira, 5 de julho de 2011

Tempo de conciliação

Merval Pereira, O Globo
No blog do Noblat

Estamos em tempos de conciliação política e consequente revalorização da importância do Plano Real na História do país.
O reconhecimento da presidente Dilma Rousseff do papel fundamental do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso no fim da hiperinflação e consequente estabilização econômica, que permitiu a retomada do planejamento para o desenvolvimento do país, e os generalizados aplausos na morte do ex-presidente Itamar Franco, reconhecido como o responsável pela implantação do Plano Real, fazem parte desse novo cenário que recupera a História do Brasil.

Não é por acaso, portanto, que o excelente livro de Miriam Leitão "Saga brasileira, a longa luta de um povo por sua moeda" está em primeiro lugar na lista dos mais vendidos no país há seis semanas seguidas.

Além da sua qualidade intrínseca, o livro chega numa hora em que o país redescobre seu passado, abafado há quase dez anos por campanha política negacionista que tinha o fim único de exaltar o governo petista pela anulação dos méritos de governos anteriores.

Pura tática marqueteira que deu certo até que dois acontecimentos tiveram a capacidade de destampar o passado recente: os 80 anos de FH e a morte de Itamar.

Ele e Fernando Henrique, corresponsáveis pela mais exitosa ação político-econômica do Brasil moderno, foram separados pela disputa política, mas nunca chegaram a romper, como aconteceu com Lula e FH.
(...)

Um depoimento isento é o do ex-ministro da Fazenda Rubem Ricupero, que afirma que a importância de Itamar para a estabilização da economia foi decisiva porque, naquele momento de transição, ele era o único que acreditava que seria possível dar um golpe definitivo na inflação.

Mas Ricupero sabe que Itamar não "tinha uma ideia clara" de como fazer isso e andava em busca de um novo Plano Cruzado.
"Inclusive, depois que o real foi introduzido, Itamar ainda queria um congelamento de preços", lembra Ricupero em entrevista à BBC.

Por diversas vezes o ex-presidente Itamar o classificou como o "sacerdote" ou "apóstolo" do Real, mas Ricupero desconfia que "ele fazia isso principalmente para retirar um pouco do crédito pelo Plano Real da equipe de Fernando Henrique Cardoso."

Havia muita mágoa.
Itamar era político interessante, imprevisível, reagia espontaneamente a tudo, tinha algumas ideias fixas — umas bem atrasadas como um nacionalismo que não se modernizou: era contra todas as privatizações, embora tenha sido no seu governo que a CSN foi privatizada.

A ideia do relançamento do fusca não tinha cabimento, mas embutia a proposta de um carro popular, o que mais tarde foi feito com carros economicamente viáveis.

Ele tem todos os méritos por permitir que o Plano Real se efetivasse, mas durante sua gestação várias vezes atrapalhou, como quando quis o congelamento de preços a que se referiu Ricupero.

Seu sonho dourado era a popularidade que o Plano Cruzado trouxera ao ex-presidente José Sarney, e, se dependesse dele e de seus assessores, a República do Pão de Queijo, seriam tomadas medidas populistas que prejudicaram o Cruzado e inviabilizariam o Real.
(continua)

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