sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

REVEL PASSOU POR AQUI


Entre o fim do mundo e o Natal (se este acontecer é sinal que o primeiro falhou) há um bom tempo para dedicar um pouco de atenção a reflexões que não perdem a validade nunca e às vezes parecem mais atuais quanto mais o tempo passa.

O que vem acontecendo na política brasileira nas últimas semanas, desde a condenação dos réus do mensalão às reações desproporcionais que ela vem provocando, nos dá uma boa oportunidade de revisitar aquela que foi uma das inteligências mais agudas que alimentou os debates intelectuais no século passado e o começo deste.

Jean François Revel, que foi filósofo, escritor, jornalista e membro da Academia Francesa, e viveu de 1924 a 2006, ainda é uma referência viva quando se discutem as consequências e as distorções provocadas pela ideologia na vida das nações.

“A necessidade de ideologia” é um dos seus ensaios mais incisivos. Ele é dividido em 3 partes e pode ser encontrado entre outros textos seus no Blog do Orlando Tambosi (otambosi.blogspot.com.br), professor associado da Universidade Federal de Santa Catarina.
Começa perguntando - o que é ideologia? – e respondendo:

É uma tripla dispensa: dispensa intelectual, dispensa prática e dispensa moral.

Resumindo: a primeira consiste em reter apenas os fatos favoráveis às ideias que se defendem, inclusive inventando-os e negando outros, tratando de omiti-los, de esquecê-los, e de impedir que sejam conhecidos; a segunda, suprime o critério da eficácia, tirando todo valor de refutação aos fracassos; a terceira, abole toda noção do bem e do mal para os atores ideológicos.

Vai além Revel: “Os socialistas (usamos a expressão original do ensaio, ainda que no caso brasileiro isso possa ser considerado uma licença poética, se levarmos em conta a diferença entre teoria e prática do partido ao qual nos referimos ) têm um conceito tão elevado da própria moralidade que ao ouvi-los, podemos ser levados a crer que eles tornam a corrupção honrada quando se entregam a ela, em vez de ela empanar a sua virtude, quando sucumbem à tentação”.

Mais adiante: “Em seu começo, uma ideologia é uma fogueira de crenças que, ainda que devastadora, pode inflamar nobremente os espíritos. Em seu término, se degrada em um sindicato de interesses”.

As reações do PT às decisões da Justiça, o discurso revanchista de quem se considera vítima de uma conspiração golpista, as ameaças de desobediência e de desordem civil não soam como algo muito familiar a esse texto?

Não parece que Revel andou pelo Brasil na semana passada, ou leu jornais brasileiros nos últimos meses?

Sandro Vaia é jornalista. Foi repórter, redator e editor do Jornal da Tarde, diretor de Redação da revista Afinal, diretor de Informação da Agência Estado e diretor de Redação de “O Estado de S.Paulo”. É autor do livro “A Ilha Roubada”, (editora Barcarolla) sobre a blogueira cubana Yoani Sanchez. 

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