domingo, 19 de junho de 2011

Cirurgias de aneurisma estão suspensas

FELIPE ODA - Estadão

O rosto da cozinheira Emília Alves Soares, de 55 anos, está formigando.
É com a fala embolada que ela conta à reportagem sobre o cancelamento da cirurgia de aneurisma cerebral pela qual deveria ter passado na último dia 3, no Hospital das Clínicas.

A paciente faz parte das centenas de pessoas que enfrentam a paralisação das cirurgias endovasculares eletivas para o tratamento da doença no País, suspensas porque o Ministério da Saúde reduziu o valor destinado à compra do material usado nesse tipo de procedimento.

Apesar dos sintomas, casos como o de Emília têm sido tratados como eletivos há três meses nos hospitais brasileiros.
Por isso, ela foi orientada a voltar para casa e a retornar apenas se houvesse sangramentos.
Quando isso ocorre, significa que o aneurisma já se rompeu, situação que provoca a morte imediata de 40% dos pacientes não operados, segundo a Sociedade Brasileira de Neurorradiologia Diagnóstica e Terapêutica (SBNRDT).
Dos sobreviventes, metade fica permanentemente incapaz para trabalhar.

“Estou entregue à sorte”, lamenta Emília.

O problema com o material começou em 16 de dezembro de 2010, quando o Ministério da Saúde publicou a Portaria nº694, que reduziu, inicialmente, de R$ 2.230 para R$ 1.100 o valor pago para cada espiral de platina usado na cirurgia.
Hoje, o valor está em R$ 1.350.
São necessários de cinco a 12 espirais por procedimento – a operação pode chegar, portanto, a cerca de R$ 30 mil.

A situação se refletiu no atendimento aos pacientes há três meses, segundo a SBNRDT, quando os estoques de espirais começaram a acabar nos hospitais.
Segundo Paulo Eloy de Passos Filho, presidente da SBNRDT, “o Governo tomou a decisão de reduzir o preço sem consultar ninguém”.

Apenas “alguns hospitais estão em situação normal porque têm material em consignação e por contrato não podemos retirá-los”, detalha Alexander Moreira, presidente da Associação Brasileira de Distribuidores e/ou Importadores de Material Médico de Alta Complexidade (Abdimmac).

“O próprio médico (do Hospital do Mandaqui) contou que o SUS cortou a verba e não poderia me operar”, explica a costureira Iraci Freire dos Santos, de 47 anos, que tentou ser operada em maio deste ano, no Hospital das Clínicas.

Em entrevista ao JT, o Ministério da Saúde admitiu “eventuais problemas” na realização do procedimento e justificou que reduziu o valor na tabela SUS dos espirais com base em estudos técnicos e econômicos.

Segundo a ABDIMMAC, enquanto não houver reajuste no valor pago não será possível importar o material.

“Não conseguimos pagar nem os impostos com o valor atual oferecido pelo SUS”, afirma Moreira.

Nenhum comentário:

Postar um comentário